Dos grandes jornais brasileiros, só dois manchetearam a nova façanha científica: Folha de S.Paulo ("Ciência cria primeira célula sintética") e O Globo ("Criada vida artificial").
Provocadora como sempre, a Folha fez constar em sua capa uma afirmação para melindrar os leitores mais devotos:
"Os estudos, feitos por 15 anos, provam que a vida não precisa de força especial para existir".
O próprio líder da equipe de pesquisadores, Craig Venter, insinuou ter desalojado Deus:
"Essa é a primeira criatura do planeta, uma espécie que pode se replicar, cujo pai é um computador".
Talvez a melhor explicação do que realmente houve seja a do jornalista Marcelo Leite, da Folha:
"Embora Craig Venter tenha anunciado a primeira 'célula sintética', na realidade seu grupo não criou um organismo a partir do zero. Ele provou que é capaz de recriar e fazer funcionar um organismo ultrassimples apagando seu software biológico e enxertando outro muito parecido".
O certo é que o tal organismo ultrassimples, engendrado pela combinação do que já existia com o toque do dedo do homem (no teclado do computador), passa a replicar-se por si próprio.
É como um robô que conseguíssemos programar para multiplicar-se em outros robôs idênticos, indefinidamente.
E, claro, doravante o processo será estendido a organismos cada vez menos simples.
Venter imagina que já em 2011 tenhamos vacinas de gripe feitas de células sintéticas.
Prevê-se também a criação, entre outras aplicações, de bactérias programadas para resolver problemas ambientais e energéticos; p. ex., que produzam combustíveis ou que sequestrem gás carbônico do ar.
Mas, os cientistas costumam ser tão brilhantes em suas especialidades quanto ingênuos em relação a todo o resto. Einstein que o diga: convenceu Roosevelt a iniciar o projeto atômico, pensando que serviria apenas para conter Hitler.
Basta lermos o noticiário com atenção para cair a ficha. Abriram-se as mais vastas e inquietantes perspectivas para o desenvolvimento de armas biológicas, que tendem agora a tornar-se ainda mais devastadoras do que as nucleares.
De imediato, preocupa a possibilidade de que alguma dessas criações experimentais, inacabadas, escape do laboratório e passe a atuar livremente, quando então se conheceriam os efeitos nocivos não previstos.
Como até os trash movies podem antecipar a vida, seria algo próximo daquela aranha turbinada para crescer que foge do laboratório no filme Tarântula (1955, dirigido por Jack Arnold) e vai atingindo proporções descomunais -- com a diferença de que gigantesca seria a profusão de aranhas microscópicas em contínua replicação. Algo muito mais letal do que uma única criatura monstruosa.
A ficção foi atualizada pelo novelista Stephen King em A Dança da Morte (1978), sobre uma arma biológica que sai do controle e extermina quase toda a humanidade.
Falta, talvez, um livro e/ou filme sobre uma arma biológica que seja utilizada premeditadamente contra determinada população e acabe atingindo universo bem mais amplo.
Foi a hipótese fantasiosa que andou circulando sobre a aids: a de que teria sido criação de algum Dr. Silvana imperialista, para exterminar africanos.
De qualquer forma, temos mais é de pôr as barbas de molho: a energia nuclear também foi anunciada como solução energética, mas veio primeiro a utilização bélica e ela virou, isto sim, um enorme problema.
Tanto que a espécie humana esteve a um passo da extinção em 1962, quando da crise dos mísseis cubanos.
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